A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou, por unanimidade, pedido de extradição do empresário Ali Sipahi formulado pelo governo da Turquia. A decisão foi tomada nesta terça-feira (6) no julgamento da Extradição (EXT) 1578. O pedido do Estado turco estava baseado na acusação de que o empresário, naturalizado brasileiro, integraria organização terrorista. Segundo a decisão do colegiado, no entanto, a entrega de Sipahi não encontra amparo na legislação brasileira.
De acordo com o governo turco, Ali Sipahi integraria uma organização terrorista liderada pelo clérigo Fetullah Güllen, que teria tentado golpe armado contra o presidente da Turquia. O Estado requerente afirma que o empresário teria depositado 1.721,38 liras turcas (em torno de R$1,9 mil) no Bank Asya, entre 31 de dezembro 2013 a 24 de dezembro 2014, em uma conta vinculada ao grupo e, portanto, teria financiado a organização terrorista.
Em seu voto proferido nesta tarde, o relator do pedido, ministro Edson Fachin, negou o pedido com base em três aspectos. Apesar de os supostos crimes terem sido praticados antes da naturalização como brasileiro – ocorrida em 2016 –, situação que, segundo o ministro, não impediria a extradição, o primeiro óbice é a ausência de dupla tipicidade, que veda a extradição de estrangeiro quando o fato não constituir infração penal em ambos os países. Como o suposto delito teria ocorrido em 2013 e 2014 e a lei que disciplina o terrorismo no Brasil é de 2016 (Lei 13.260), a conduta imputada a Sipahi não seria classificada como crime nos dois países à época dos fatos.
O segundo óbice apontado pelo relator refere-se à possibilidade de os fatos atribuídos ao extraditando poderem ser enquadrados na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/1983), que tratam de crimes contra a segurança nacional e a ordem política e social. Ocorre que, segundo o ministro, o STF firmou entendimento no sentido de que os crimes políticos foram incorporados ao ordenamento infraconstitucional com status de delito contra a segurança nacional. Nessa hipótese, explicou o ministro, incidiria a vedação prevista no artigo 5º, inciso LII, da Constituição Federal, segundo o qual “não será concedida a extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião”.
Último impedimento descrito pelo ministro Fachin consta no artigo 82, do inciso VIII, da Lei de Migração (Lei 13.445/2017), que veda a concessão de extradição quando “o extraditando tiver que responder, no Estado requerente, perante tribunal ou juízo de exceção”. “Pode ser considerado fato notório a instabilidade política e até mesmo as demissões de juízes, bem como as prisões de opositores do governo do Estado-requerente. Em tais circunstâncias, há no mínimo uma justificada dúvida quanto às garantias de que o extraditando será efetivamente submetido a um tribunal independente e imparcial, num quadro de normalidade institucional, a salvo de instabilidades e pressões”, apontou o relator.
O ministro citou, ainda, resolução do Parlamento Europeu de março deste ano que condenou o aumento do controle exercido pelo Executivo e a pressão política no trabalho dos juízes e magistrados naquele país e salientou a necessidade de “uma reforma profunda dos Poderes Legislativo e Judicial, para que a Turquia melhore o acesso ao sistema judicial, aumente a sua eficácia e proporcione uma melhor proteção do direito a julgamento dentro de um prazo razoável”. A resolução ressalta ainda o fato de que a demissão de mais de 4 mil juízes e procuradores constitui uma ameaça à independência e imparcialidade do Judiciário.
“Diante de tais instabilidades na vida política do Estado requerente a solução que se apresenta, num juízo de proteção das liberdades individuais, é pelo indeferimento da extradição, eis que não se podem vislumbrar com certeza a garantia de julgamento isento de acordo com as franquias constitucionais”, concluiu Fachin.
Com o indeferimento do pedido de extradição, ficam revogadas as medidas cautelares impostas ao empresário.
GR/AD
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