Por decisão unânime dos julgadores, a Quarta Turma do TRT mineiro manteve sentença que condenou o município de Cássia a pagar R$ 25 mil de indenização por danos morais a um locutor da rádio cultural do município. Ele foi perseguido no local de trabalho após publicar críticas à gestão municipal em seu perfil no Facebook. Na conclusão dos julgadores, o município, apenas por retaliação, agiu de forma injusta e desrespeitosa para com o trabalhador, incorrendo em assédio moral passível de reparação. Conforme apurado, o “drama” vivido pelo trabalhador gerou, inclusive, impacto social na comunidade, com repercussão na população local, em torno de 18 mil habitantes.
O voto da relatora, desembargadora Paula Oliveira Cantelli, acolhido pelos demais integrantes da Turma, foi desfavorável ao recurso do município. Segundo pontuado, o assédio moral se configura quando o empregador ou seus prepostos, por condutas reiteradas, atingem negativamente a dignidade psíquica do trabalhador, de forma a abalar o ambiente de trabalho, tornando-o inóspito para o indivíduo, exatamente como ocorreu com o radialista. A relatora também registrou que é dever do empregador respeitar a consciência do trabalhador, zelando pela saúde mental e liberdade de trabalho, intimidade e vida privada, honra e imagem do empregado, impedindo a prática de atos que possam afetá-lo de forma negativa, expondo-o a situações humilhantes.
Entenda o caso – O trabalhador ingressou nos quadros municipais em 1995, após aprovação em concurso público para o cargo de “auxiliar administrativo”. Mas, desde a nomeação, foi designado para exercer a função comissionada de locutor na rádio cultural do município. Após 23 anos na função, ele fez publicações, em seu perfil no Facebook, contendo críticas aos administradores municipais sobre a iluminação da cidade. A partir daí, foi retirado da função de radialista e transferido para o Departamento de Educação e Turismo, setor que não contava com qualquer estrutura e onde permaneceu em situação de extrema ociosidade, considerada degradante pelos membros da Turma.
A relatora observou que o município não estava obrigado a manter o autor no cargo de locutor, já que se tratava de função comissionada (de livre nomeação e exoneração). Mas, conforme registrou, apesar de não ter sido ilegal, a conduta do município não foi justa para com o trabalhador.
A prova testemunhal foi consistente ao revelar as más condições de trabalho impostas ao radialista, em consequência das publicações na rede social de críticas à gestão ambiental. Inclusive, foi exibida em juízo captura de tela, comprovando o teor dessas publicações. Segundo relatos das testemunhas, o autor passou a cumprir jornada sem qualquer companhia e também sem tarefas para realizar. Fotografias anexadas ao processo demonstraram como ele permanecia isolado no local de trabalho, que não contava com a mínima estrutura material.
De acordo com a relatora, o empregado foi colocado na “geladeira", o que é um dos nítidos traços do assédio moral. Ela frisou que, em verdadeira retaliação às publicações do trabalhador na rede social, o município o retirou da função de locutor, ocupada por 23 anos, transferindo-o para setor sem qualquer estrutura material e colocando-o em condição de ociosidade extrema. Além disso, foi constatado que a destituição do autor da função de locutor da rádio cultural do município gerou impacto social, com repercussão na população.
Ao se defender das acusações de assédio moral, o município apresentou documento em que declarou que o empregado foi retirado do cargo de locutor para corrigir "desvio de função” e, diante da “necessidade de auxiliar administrativo para desempenhar atividades na Secretaria de Turismo”, que contava apenas com o secretário. Mas isso não convenceu os julgadores. Nesse mesmo documento, a administração pública reconheceu que o autor era "pessoa capaz e de notório conhecimento na área cultural e turística", além de "servidor eficiente e dedicado", o que, como destacou a relatora, apenas reforçou o fato de que ele foi vítima de perseguição injusta no local de trabalho.
“Todos os elementos demonstram que, apesar das justificativas prestadas pelo recorrente, a transferência do autor não ocorreu pelos motivos apresentados, denotando retaliação e colocando-o em situação de labor degradante - inclusive com repercussão perante a população da cidade - o que configura o assédio moral, ensejando reparação”, frisou a desembargadora.
Em parecer emitido no processo, o representante do Ministério Público do Trabalho (MPT) também se manifestou pela condenação do município de Cássia ao pagamento de indenização pelos danos morais que causou ao trabalhador. Registrou que, apesar não haver ilegalidade na exoneração do autor do cargo de locutor, ele sofreu danos morais pela perseguição realizada pelos integrantes da administração pública, especialmente o prefeito.
Ao finalizar, a desembargadora ponderou que o respeito aos direitos fundamentais dos trabalhadores vítimas do assédio moral não depende da existência de outras previsões normativas, tendo em vista a aplicabilidade imediata dos dispositivos constitucionais protetivos da dignidade, da não discriminação, da honra, da intimidade e do valor social do trabalho.