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Companhia aérea deve indenizar passageiro por racismo estrutural
Homem sofreu abordagens preconceituosas.
O Juizado Especial Cível da Comarca de Boituva condenou uma companhia aérea a indenizar, por danos morais, passageiro que foi vítima de racismo durante voo. A quantia foi fixada em R$ 10 mil. De acordo com o processo, o autor viajava de Natal para São Paulo quando vivenciou duas situações durante o voo.
Em assento confort (adquirido pelo passageiro por um custo adicional de R$ 39,99) e usando um tablete, o autor foi abordado pela comissária e informado de que não poderia portar nada em mãos naquele assento. Para poder usar o tablete, optou por sentar em assento convencional, mas viu um casal sentado em assentos confort similares aos dele utilizando dispositivos eletrônicos, sem receberem nenhum alerta da equipe de comissários. Em outro momento da viagem, o passageiro solicitou uma batata e um refrigerante e a comissária, ao entregar os produtos, lhe perguntou se ele gostaria de um copo a mais para dividir com outro passageiro, negro, que estava sentado perto, supondo que seriam parentes por serem negros. Após a viagem, o homem entrou em contato com a companhia por e-mail esperando um retorno, porém a empresa se manifestou de forma genérica.
Para a juíza Liliana Regina de Araújo Heidorn Abdala, a conduta da comissária de bordo em restringir o uso do aparelho eletrônico do autor, sem, contudo, restringir para outros passageiros sentados no mesmo tipo de assento “é claramente uma forma de privilégio, transcendendo o mero aborrecimento”. Com relação ao segundo episódio, ressalta que, em nenhum momento, os dois passageiros mantiveram contato que pudesse indicar que se conheciam. “Tratar o comportamento da funcionária da empresa como prática normal é fomentar o racismo velado, aceitar com normalidade a conduta de se presumir que dois negros viajando em um mesmo voo se conheçam e mantenham de qualquer forma um vínculo, apesar de não terem tido nenhum tipo de contato durante toda a viagem, a ponto de dividir a mesma bebida, é fomentar a conduta de preconceito racial baseado”, afirmou.
Na sentença, a magistrada cita autores que abordam o racismo estrutural, entre eles Silvio Almeida: “O racismo é uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do modo ‘normal’ com que se constituem as relações políticas, econômicas e jurídicas e até familiares, não sendo uma patologia social e nem um desarranjo institucional. O racismo é estrutural. Comportamentos individuais e processos institucionais são derivados de uma sociedade cujo racismo é regra e não exceção O racismo é parte de um processo social que ocorre ‘pelas costas’ dos indivíduos e lhe parece legado pela tradição”.
Cabe recurso da decisão.
Processo nº 1003699-03.2018.8.26.0082
Fonte: TJ-SP