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Município é condenado por lançar esgoto a céu aberto
Lançamento de esgoto sanitário in natura em cursos d’água é proibido por lei. Mas essa é a realidade de Coronel Pacheco. Como não há provas de que o município vem providenciando melhorias ou minimizando os efeitos negativos dessa prática ilegal, e está descumprindo legislação e decisão judicial, o juiz Marcelo Alexandre do Valle Thomaz, da 2ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias Municipais de Juiz de Fora, determinou que o réu interrompa o lançamento de efluentes sanitários, sem tratamento prévio, no solo e nos cursos d’água.
Pela decisão, o Município deve adotar todas as medidas necessárias para a obtenção das licenças ambientais dos sistema de tratamento de esgoto sanitário e implementar o sistema completo, dando destinação adequada aos efluentes urbanos e rurais, mediante o cumprimento das exigências legais e de todas as condicionantes fixadas por órgão ambiental competente.
O juiz fixou o prazo máximo de dois anos para o cumprimento das determinações, com início imediato. A cada seis meses deve prestar contas sobre as medidas que estão sendo tomadas.
O juiz deixou de fixar multa em caso de descumprimento, mas alertou que poderá fazê-lo se houver resistência do ente público no cumprimento dessa decisão.
O juiz também condenou o réu ao pagamento de dano moral coletivo no valor de R$ 200 mil, devendo ser revertido ao Fundo Estadual de Defesa dos Direitos Difusos (Fundif), criado pela Lei 7.347/85.
Defesa
O município alegou não possuir recursos financeiros para providenciar o tratamento de esgoto sanitário na cidade. Disse ter lançado mão de todos os esforços necessários para o devido equacionamento da questão. Foram aprovadas leis municipais e aporte de recursos, no sentido de buscar resolver o problema de acordo com suas condições orçamentárias e financeiras. No entanto, sustentou que não há previsão orçamentária na lei municipal que disponha sobre o orçamento anual para a execução das obras.
Segundo o município, para implantar os padrões de qualidade das normas regulamentares e promover o tratamento adequado do esgoto, o custo aos cofres públicos seria superior a R$ 8 milhões, valor que extrapola em muito as condições atuais dos cofres municipais. Sustentou, ainda, não possuir receitas próprias nem previsão para “implantação de uma estação de tratamento de esgoto (ETE)” na forma exigida pelo Ministério Público.
Dever
O Ministério Público ressalvou que a legislação proíbe expressamente o lançamento de esgoto sanitário in natura em cursos d’água e que precedentes jurisprudenciais reconhecem a gravidade do problema, asseverando que a proteção ao meio ambiente é pressuposto para o atendimento do mais importante dos valores fundamentais, que é o direito à vida.
Afirmou que o réu ignorou a Deliberação Normativa 128/2008 do Conselho de Política Ambiental (Copam), que convocou todos os municípios mineiros para o licenciamento ambiental de seus sistemas de tratamento de esgoto. O ato normativo estabeleceu que os municípios do porte de Coronel Pacheco deveriam cadastrar-se até março de 2008 e, até março de 2017, formalizar o processo de autorização ambiental de funcionamento
E argumentou que a ausência de previsão orçamentária não afasta o dever constitucional imposto ao Município de Coronel Pacheco de preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
Gravidade
Perícia apresentada pelo Ministério Público apontou os impactos negativos com o lançamento de esgotos sem tratamento prévio: elevação da concentração de matéria orgânica, o que pode resultar em mortandade de peixes; toxidade às espécies aquáticas; elevação da concentração de sólidos e, consequentemente, alteração da turbidez e cor das águas; surgimento de espumas e maus odores; criação de condições adversas às atividade sociais e econômicas; e prejuízo à saúde, à segurança e ao bem-estar da população.
Decisão
Em decisão liminar, o Tribunal de Justiça determinou que até dezembro de 2019 o município adotasse as medidas necessárias para a obtenção das licenças ambientais do sistema de tratamento de esgoto sanitário e iniciasse os procedimentos destinados ao adequado tratamento de esgoto na localidade.
De acordo com os autos, no entanto, o réu em nenhum momento informou acerca do cumprimento dessa ordem, sempre afirmando não haver condições financeiras para tanto.
“Certo é que já decorreu o prazo estipulado na decisão liminar e o processo tramita há três anos sem que o município tomasse providência, o que, em tese, pode até mesmo configurar crime de responsabilidade”, afirmou o juiz.
Citando a perícia, o juiz lembrou que os serviços de saneamento básico impactam diretamente a saúde, a qualidade de vida, bem como o desenvolvimento de uma sociedade. Segundo ele, a prestação desse serviço “garante o mínimo existencial a ser reclamado do Estado para assegurar que se desfrute de uma vida digna”.
“Há um conjunto de direitos que não pode, em hipótese alguma, ser preterido, pois constitui o objetivo e fundamento primeiro do Estado Democrático de Direito. Nesse sentido, o direito à vida e à saúde deve se sobrepor a qualquer outro, sendo que a mera alegação de ausência de previsão orçamentária não refuta a obrigação de garantir o mínimo existencial”, concluiu.
Processo PJe nº 5015177-39.2017.8.13.0145
Fonte: TJ-MG